O recente caso judicial envolvendo o jogador de futebol Hulk e uma vizinha que alegou transtornos durante sua festa de casamento em João Pessoa (PB) se tornou um exemplo prático dos desafios enfrentados em conflitos de vizinhança. A Justiça da Paraíba julgou improcedente o pedido de indenização em primeira instância, e segundo o advogado especialista em Direito Imobiliário e Direito Processual Civil, Raphael Mançur, a ausência de provas robustas foi o fator determinante para a decisão.
O caso teve origem com uma vizinha que mora ao lado de um terreno à beira-mar no bairro do Bessa, onde foi realizada a festa de casamento de Hulk e Camila Ângelo, em 7 de janeiro. Segundo o processo, durante os preparativos do casamento, a limpeza do local gerou poeira que entrou no apartamento dela, causando problemas respiratórios na filha de 13 anos e no pai de 70 anos. A vizinha também alegou que foi colocado um gerador de energia a diesel em frente ao imóvel, que fez fumaça e odor fortes, além de barulho intenso no dia do evento, o que teria impossibilitado ela de permanecer no apartamento e causado sintomas físicos como tontura.
No entanto, a juíza responsável considerou não suficientes os e-mails e vídeos anexados como prova, além de não haver testemunhas nem laudos médicos que comprovassem os danos alegados. A magistrada também levou em conta que a Secretaria Municipal do Meio Ambiente confirmou que o evento tinha autorização legal e monitoramento de som.
Para Raphael Mançur, o caso ilustra perfeitamente os limites do direito de vizinhança estabelecidos no Código Civil brasileiro. "O direito de vizinhança trata da harmonização entre o uso da propriedade e o respeito ao direito dos vizinhos. O art. 1.277 do Código Civil dispõe que 'O proprietário ou possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha'", explica o especialista.
Segundo Mançur, trata-se de uma limitação ao exercício do direito de propriedade, onde "ninguém pode usar sua propriedade de forma a causar prejuízo à saúde, segurança ou sossego do vizinho, ainda que esteja dentro de sua própria área".
O advogado destaca que a improcedência da ação se deveu principalmente à insuficiência probatória. "Para que o pedido de indenização ou cessação do incômodo seja aceito, é imprescindível a comprovação dos fatos alegados. É fundamental apresentar provas periciais, testemunhais ou documentais, como laudos médicos, boletins de ocorrência ou autos de infração ambiental", afirma.
No caso específico, Mançur observa que "a ausência de prova técnica e testemunhal consistente foi determinante para a improcedência da ação", uma vez que os e-mails e vídeos apresentados foram considerados insuficientes pela magistrada.
Outro aspecto relevante apontado pelo especialista é a jurisprudência consolidada sobre incômodos eventuais. "A jurisprudência tende a não reconhecer como ilícitos os incômodos episódicos, como festas pontuais com autorização legal. Neste caso, o caráter temporário e excepcional da festa foi relevante na decisão", explica Mançur.
O advogado ressalta que "o ordenamento não exige uma vizinhança livre de todo e qualquer incômodo, apenas daquilo que seja excessivo, contínuo e sem justificativa razoável".
A decisão destacou ainda que a festa tinha autorização da SEMAN (Secretaria Municipal do Meio Ambiente) para a realização e monitoramento sonoro, aspecto que Raphael Mançur considera fundamental. "A autorização não afasta automaticamente a responsabilidade civil, mas dificulta a configuração de abuso de direito", analisa.
Para o especialista, "o uso da propriedade deve respeitar a boa-fé objetiva e a função social, compatibilizando o interesse do proprietário com o bem-estar da coletividade. No caso, não se verificou abuso, desvio de finalidade ou uso anormal da propriedade".
Mançur orienta que, quando o incômodo realmente ocorre e ultrapassa os limites da normalidade, o vizinho pode adotar diversas medidas legais:
Notificação extrajudicial: Para buscar uma solução consensual e demonstrar boa-fé.
Acionamento de órgãos públicos: Como Prefeitura ou Secretaria do Meio Ambiente para fiscalizar níveis de ruído ou poluição sonora, ou em casos urgentes, a Polícia Militar para cessar barulhos em festas.
Ação judicial: Incluindo ação de obrigação de fazer ou não fazer (para cessar incômodos) e ação de indenização por danos morais e materiais (em caso de prejuízos comprovados à saúde, integridade física, sossego ou ao imóvel).
"O caso em questão é um clássico conflito de vizinhança em que o Judiciário precisou ponderar entre o direito de propriedade e o direito ao sossego e à saúde do vizinho", conclui Raphael Mançur.
Serviço:
Raphael Mançur Advogados Associados
Site:
Instagram: @raphaelmancur.adv
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KAUE PALLONE RODRIGUES DOS SANTOS
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