O Supremo Tribunal Federal analisará no próximo 1º de outubro de 2025 o Recurso Extraordinário nº 1.446.336, com repercussão geral, para decidir se motoristas de aplicativos devem ser reconhecidos como empregados nos moldes da CLT. O julgamento vai muito além de um litígio específico: discute o futuro do trabalho digital no Brasil e coloca à prova a capacidade do Direito de conciliar inovação tecnológica, liberdade econômica e proteção social.
No chamado capitalismo de plataforma, a produção é mediada por algoritmos que controlam preços, monitoram desempenho e distribuem tarefas, fenômeno descrito como subordinação algorítmica. O trabalhador passa a ser guiado por um “empregador invisível”: não há ordens diretas, mas comandos digitais que determinam toda a atividade.
Juristas que defendem o reconhecimento do vínculo afirmam que a Constituição de 1988 protege o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana. Para eles, negar a natureza empregatícia significaria fragilizar esses fundamentos.
Argumentam ainda que a subordinação algorítmica representa uma forma de controle ainda mais intensa que a tradicional, marcada por vigilância constante, metas ocultas e possibilidade de desligamento automático. Reconhecer o vínculo seria, portanto, atualizar a CLT para as novas realidades digitais e garantir a inclusão social desses trabalhadores.
Já os defensores da não aplicação do vínculo empregatício destacam que a economia de plataformas depende da livre iniciativa e da liberdade de empreender. Impor o modelo clássico da CLT poderia desestruturar o negócio, reduzir oportunidades de renda e prejudicar a mobilidade urbana.
Nesse modelo, motoristas escolhem seus horários, podem recusar corridas e atuar em diversas plataformas, o que se aproximaria mais do trabalho autônomo ou do empreendedorismo individual. Para essa visão, a regulação deve ser moderna e flexível, sob pena de engessar a inovação.
O Supremo enfrentará um dilema: de um lado, direitos sociais que garantem proteção ao trabalhador; de outro, a livre iniciativa, motor do desenvolvimento econômico. A decisão pode resultar em três cenários:
Reconhecimento pleno do vínculo empregatício.
Rejeição do vínculo e consolidação do modelo atual.
Criação de uma solução híbrida, com novas categorias jurídicas adaptadas ao trabalho digital.
O julgamento do STF será paradigmático. Uma decisão pró-vínculo poderá alinhar o Brasil a países como a Espanha, que adotou a Ley Rider. Já uma decisão contrária reforçará a autonomia das plataformas, mas exigirá que o Legislativo crie novos modelos de proteção híbrida.
Como observa Leandro Velloso, “o futuro do trabalho não será puramente subordinado nem totalmente autônomo, mas híbrido, demandando diálogo entre Direito, tecnologia e economia.”
O 1º de outubro de 2025 pode marcar o momento em que o Brasil definirá se a inovação digital será acompanhada pela proteção social ou se permanecerá em um modelo de risco e flexibilidade.
Leandro Velloso — Pesquisador em Direitos Fundamentais (PPGD/FDV), Docente de Direito na Universidade Estácio de Sá, Advogado, Gestor Público, Autor de 16 livros jurídicos, Pós-Graduado pela PUC/SP e especialista em Direito Administrativo, Processo do Trabalho e Direitos Humanos.
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PRISCILA GONZALEZ NAVIA PIRES DA SILVA
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