Daniela Lopes Marcellino*
A Medida Provisória nº 1.303, editada pelo governo federal, ficou conhecida sobretudo pelas alterações na tributação do IOF, das debêntures e dos juros sobre capital próprio (JCP). No entanto, entre seus dispositivos, há uma mudança de grande impacto para as empresas: a inclusão de novas hipóteses em que compensações tributárias serão consideradas “não declaradas”.
Mais uma vez, o Executivo lança mão de restrições ao instituto da compensação como instrumento para reforçar a arrecadação. A MP altera o artigo 74 da Lei nº 9.430/1996, prevendo situações que, na prática, esvaziam a segurança jurídica do contribuinte.
A primeira novidade é a previsão de que compensações baseadas em pagamentos indevidos ou a maior, realizados por Documento de Arrecadação de Receitas Federais (DARF) inexistente, serão tratadas como não declaradas. Em tese, o risco de uso de DARFs fictícios já estaria mitigado pelo próprio sistema PER/DCOMP Web, que exige a vinculação a um pagamento efetivamente identificado na base de dados da Receita Federal. Nesse sentido, a MP apenas reforça uma limitação que, na prática, já existe.
Mais sensível, porém, é a segunda alteração: créditos de PIS e Cofins aproveitados em pedidos de ressarcimento ou compensação serão desconsiderados se, na visão da Receita Federal, não estiverem vinculados à atividade econômica da empresa. É nesse ponto que surge a maior insegurança. A interpretação sobre o que é ou não “insumo” passível de creditamento relevante já gera litígios volumosos no contencioso tributário, com entendimentos muitas vezes restritivos por parte do Fisco. A ampliação dessa margem interpretativa tende a intensificar glosas, transformando em “não declarada” uma compensação que, para o contribuinte, se baseia em utilização de crédito legítimo.
O problema central é que, uma vez enquadrada como não declarada, a compensação deixa de ter acesso à via administrativa para contestação. Isso significa que os débitos compensados podem ser imediatamente exigidos, sem suspensão da exigibilidade, restando ao contribuinte apenas a via judicial para discutir o tema. Na prática, amplia-se a litigiosidade e eleva-se o custo de defesa para os contribuintes. o setor produtivo.
O prazo de vigência da MP 1.303 expira em 8 de outubro. Até lá, caberá ao Congresso decidir se essa restrição — que pode representar significativo aumento de arrecadação no curto prazo — justifica o enfraquecimento de um mecanismo de compensação já marcado por excessiva burocracia e insegurança. O debate parlamentar será, portanto, decisivo para equilibrar a sanha arrecadatória do Estado e a necessidade de segurança jurídica para as empresas.
*Daniela Lopes Marcellino é sócia da Elebece Consultoria Tributária
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MURILO DO CARMO JANELLI
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